Neste fim de semana o comitê de administração da Associação Psiquiátrica Americana votará sobre se deve adotar ou não um novo sistema de diagnóstico para algumas das síndromes mais sérias e impactantes da medicina: os transtornos de personalidade.
Em sua plenitude, esses transtornos são difíceis de se caracterizar e tratar, e os médicos raramente fazem avaliações com a devida atenção, perdendo ou menosprezando padrões de comportamento subjacentes a problemas como depressão e ansiedade em milhões de pessoas.
A nova proposta – uma parte dos esforços da associação psiquiátrica, que duram muitos anos já, para atualizar o seu influente manual de diagnóstico – deverá esclarecer esses diagnósticos e integrá-los melhor à prática clínica, para estender e melhorar os tratamentos. Mas esses esforços já encontraram tanta oposição que provavelmente serão relegados a uma posição marginal no manual, se é que serão permitidos.
O exercício forçou os psiquiatras a confrontarem uma das questões mais elementares – e, apesar disso, ainda não resolvidas – da área: o que é exatamente um problema de personalidade?
Não era para essa pergunta ser tão difícil, mas parece que produzir definições precisas e duradouras de padrões extremos de comportamento é um trabalho sem fim. Demorou mais de uma década de observação de pacientes para que o psiquiatra alemão Emil Kraepelin pudesse traçar uma linha clara entre transtornos psicóticos, como esquizofrenia, e problemas de temperamento, como depressão e transtorno bipolar.
Com o tempo, vários protótipos surgiram, como o compulsivo, que vive sua vida de acordo com um padrão preconcebido e irrevogável. O narcisista, com sua autoaprovação tão grandiosa quanto frágil. O dependente, com sua carência sufocante. O histriônico, sempre envolvido em algum drama, desesperado para ser o centro das atenções.
Dez tipos
No final da década de 1970, Ted Millon, diretor científico do Instituto de Estudos Avançados em Personologia e Psicopatologia, reuniu o grosso de um trabalho sobre transtornos de personalidade, a maior parte dele descritivo, e o transformou num conjunto de dez tipos padronizados para o terceiro manual de diagnóstico da Associação Psiquiátrica Americana. Publicado em 1980, é um best-seller entre os profissionais de saúde mental do mundo inteiro.
Esses critérios para diagnóstico tiveram efeitos duradouros e levaram a melhorias nos tratamentos de muita gente, como aqueles com transtorno de personalidade borderline, ou limítrofe.
Apesar desse progresso, muitos especialistas da área começaram a defender a ideia de que o catálogo de diagnósticos precisava ser reescrito. Um dos motivos para isso é o de que algumas categorias se sobrepunham e indivíduos problemáticos com frequência recebiam dois ou mais diagnósticos de personalidade.
“Transtorno de personalidade não especificado”, um rótulo genérico que significa, mais ou menos, que “esse indivíduo tem problemas”, se tornou o mais comum dos diagnósticos.
Tradução de Adriano Scandolara.
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