Bullying e suicídio
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Bullying e suicídio


Bullying passa a ser acompanhado por pediatras nos Estados Unidos

Especialistas querem acompanhar tanto vítimas quanto agressores. Ideia é tentar achar maneiras de prevenir e corrigir comportamento.

Perri Klass Do 'New York Times'
Na década de 1990, realizei exames físicos em um garoto da quinta ou sexta série da rede pública de ensino de Boston (Costa Leste dos EUA). Perguntei a ele qual era sua matéria preferida: ciências, definitivamente. Ele tinha ganhado um prêmio na feira de ciências e iria competir em uma feira com várias outras escolas.

O problema é que havia algumas crianças na escola perturbando-o diariamente por ele ter ganhado a feira de ciências. Ele era provocado, empurrado e, ocasionalmente, até agredido. A mãe do menino balançou a cabeça e se perguntou se a vida dele seria mais fácil se ele deixasse para lá essa coisa de feira de ciências.

O "bullying" (assédios e provocações) produz reações fortes e altamente pessoais. Eu me lembro do meu próprio sentimento de ofensa e identificação. Ali estava uma criança bastante inteligente, amante da ciência, possivelmente um futuro (insira aqui seu gênio favorito), atormentado por brutos. Isso foi o que fiz pelo meu paciente: aconselhei a mãe a telefonar para o professor e reclamar. Encorajei o menino a seguir com seu amor pela ciência.

Essas são três coisas que eu sei que deveria ter feito: não contei à mãe que o bullying pode ser evitado, e que isso depende da escola. Não chamei o diretor ou sugeri que a mãe o fizesse. Não pensei um segundo sequer nos provocadores, e qual seria o prognóstico para a vida deles.

Contra os bullies
 
Nos últimos anos, pediatras e pesquisadores dos Estados Unidos têm dado aos bullies (provocadores) e suas vítimas a atenção que, há tempos, eles merecem – e recebem na Europa. Ultrapassamos a ideia de que "crianças são assim mesmo", de que o bullying é uma parte normal da infância ou o prelúdio de uma estratégia de vida de sucesso. Pesquisas descrevem riscos no longo prazo – não só para as vítimas, que podem ter mais tendência a sofrer de depressão e pensamentos suicidas, mas aos próprios provocadores, que têm menos probabilidade de concluir os estudos ou se manter no trabalho.

No mês que vem, a Academia Americana de Pediatria irá publicar a nova versão de uma diretriz oficial sobre o papel do pediatra na prevenção da violência entre os jovens. Pela primeira vez, haverá uma seção sobre o bullying – incluindo uma recomendação para que escolas adotem um modelo de prevenção, desenvolvido por Dan Olweus, professor e pesquisador de psicologia da Universidade de Bergen, Noruega. Ele foi o primeiro a estudar o fenômeno do bullying escolar na Escandinávia, na década de 1970. Os programas, disse ele, "funcionam na esfera escolar, de classe e individual; eles combinam programas preventivos e lidam diretamente com as crianças identificadas como provocadoras, vítimas, ou ambos".

Robert Sege, chefe do ambulatório de pediatria do Boston Medical Center e principal autor da nova diretriz, afirma que a abordagem de Olweus concentra a atenção no maior grupo de crianças, aquelas que observam a tudo. "A genialidade de Olweus", disse ele, "é que ele consegue reverter a situação da escola. Assim, as outras crianças percebem que o provocador é alguém com problemas em controlar seu próprio comportamento, e a vítima é alguém a quem eles podem proteger".

O outro autor, Joseph Wright, vice-presidente sênior do Children's National Medical Center, em Washington, e presidente do comitê da academia pediátrica de prevenção à violência, observa que um quarto de todas as crianças relata ter se envolvido em bullying, seja como provocador, seja como vítima. Proteger as crianças de lesões intencionais é uma tarefa central para pediatras, disse ele, e a "prevenção do bullying é um subconjunto dessa atividade".

Repetição
 
Por definição, o bullying envolve repetição. Uma criança é repetidamente alvo de provocações ou ataques físicos – ou, no caso do chamado bullying indireto (mais comum entre garotas), rumores e exclusão social. Para um programa antibullying de sucesso, a escola precisa entrevistar as crianças e descobrir os detalhes – onde e quando isso ocorre. Mudanças estruturais podem ajudar a lidar com lugares vulneráveis – o cantinho do playground fora da vista, o portão de entrada da escola na hora da saída.

Então, disse Sege, "ativar os observadores" significa mudar a cultura da escola; através de discussões em sala, encontro de pais e respostas consistentes a cada incidente, a escola deve transmitir a mensagem de que o bullying não será tolerado.

O que eu devo perguntar na hora do check-up? Como vai a escola, quem são seus amigos, o que você faz no recreio? É importante abrir a porta, especialmente para as crianças na faixa etária mais provável para o bullying, para que vítimas e observadores não tenham medo de falar. Os pais dessas crianças precisam ser motivados a exigir que as escolas ajam, e os pediatras provavelmente precisam estar prontos para falar com o diretor. Nós devemos acompanhar a criança, a fim de garantir que a situação melhore, além de verificar a saúde emocional dela e buscar ajuda, se necessário.

E ajudar os provocadores, que também são, afinal, pacientes pediátricos? Alguns especialistas temem que as escolas simplesmente suspendam ou expulsem os agressores, sem prestar atenção a uma forma de ajudá-los e às suas famílias a aprender a viver de outra forma. "As políticas de tolerância zero das escolas distritais estão, basicamente, empurrando o problema para frente", disse Sege. "Temos de ser mais sofisticados."

A forma como entendemos o bullying mudou, e provavelmente mudará ainda mais. Por exemplo, nem mencionei o cyberbullying. No entanto, todos que trabalham com crianças precisam começar com a ideia de que o bullying tem consequências a longo prazo e é evitável. Eu ainda sentiria a mesma raiva, em nome do meu paciente vencedor da feira de ciências, mas agora eu vejo seu problema como uma questão pediátrica – e espero ser capaz de oferecer um pouco mais de ajuda, um pouco mais de acompanhamento, com base apropriada em pesquisas científicas.

Fonte: http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia/0,,MUL1196656-5603,00-BULLYING+PASSA+A+SER+ACOMPANHADO+POR+PEDIATRAS+NOS+ESTADOS+UNIDOS.html



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